Reino Unido: posição sobre uma semana de conflitos (6-10 de Agosto 2011)
O uso e abuso da violência caracterizaram os recentes acontecimentos no Reino Unido. A onda de indignação começou em Tottenham, um bairro de Londres, no sábado passado, após um protesto pacífico pela morte de um homem de 29 anos às mãos da polícia. Rapidamente a situação degenerou em confrontos e motins que se expandiram a outros bairros de Londres e outras cidades de Inglaterra (Manchester, Liverpool, etc.). Nestes confrontos assistiu-se a uma actuação confusa dos corpos policiais, a incêndios de carros e edifícios, a espancamentos, a assaltos a lojas, em resumo, a uma violência generalizada. Além de lojas e edifícios empresariais, os alvos da violência foram universidades, edifícios e locais públicos, carros e casas de pessoas comuns, a maioria delas seriamente afectadas pela crise económica e política que hoje impera na Europa.
As causas desta rápida generalização da violência são conhecidas de muitos. As disparidades sociais em Londres são brutais. Basta dizer que entre alguns bairros de Londres as diferenças sociais chegam a ser maior que entre os EUA e a Nicarágua. O Governo Britânico insiste em aplicar medidas de austeridade de forma socialmente cega, entre as quais o fecho de centros de juventude, uma referência diária na construção da vida das comunidades mais desfavorecidas. O drama social, que inclui elevadas taxas de abandono escolar, desemprego, precariedade, exploração laboral e pobreza coexistindo quotidianamente com uma sociedade individualista e consumista, acentuou-se. Por fim, a explosão aconteceu, com grande diversidade pessoal (vários estratos sociais, desempregados, estudantes, trabalhadores precários, voluntários sociais, …) deixando abertas feridas sociais e políticas que demorarão a sarar.
O Movimento “Democracia Verdadeira Já” condena a violência dos motins no Reino Unido. As acções praticadas em Londres constituem violações básicas e indiscriminadas dos direitos humanos, na sua maioria de pessoas comuns, sofredoras “na pele” das consequências do actual sistema. Mas não esquece que os agressores são, também eles, vítimas de violações diárias de direitos humanos exercidas por governos e grupos empresariais que, numa atitude individualista, irresponsável e desumana, prosseguem a aplicação de medidas austeridade necessárias à prossecução dos seus próprios interesses. Demonstrando profundo alheamento e desprezo pelas inúmeras vozes de revolta que ecoam na sociedade, pelos esforços democráticos de quem os critica, e pela grave crise social que as suas políticas têm gerado, e estão a gerar, nas democracias do Reino Unido, do Resto da Europa e do resto do Mundo.
Os acontecimentos do Reino Unido reforçam a nossa convicção de que é necessário intervir politicamente na sociedade de hoje. É fundamental dar voz activa a quem não a tem. É fundamental evitar a violência. É fundamental condenar o aproveitamento político do Governo Britânico, que não hesita em anunciar publicamente as mais duras penas enquanto “isenta” as suas políticas de culpas no processo e usa o medo gerado pelos conflitos para justificar graves restrições de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, nomeadamente a nível da internet. Quando pretendemos “acordar a sociedade”, quando protestamos contra as medidas de austeridade, quando exigimos uma auditoria cidadã à dívida, quando apelamos à população para que desça à rua e se organize, de forma pacífica, para exigir os seus direitos, quando combatemos uma democracia centrada em interesses económico-financeiros e alertamos para a necessidade de reforçar a participação de todos nos processos de decisão é precisamente a situação passada no Reino Unido que procuramos evitar.